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A vida sob a lona do circo: desafios por detrás do picadeiro

A equipe de jornalismo do Portal da Cidade visitou os bastidores do mundo circense para descobrir como é a vida de quem se dedica a esta arte milenar.

Publicado em 09/09/2018 às 01:56
Atualizado em

Circo Broadway em Lucas do Rio Verde (Foto: Assessoria do Circo)

Respeitável público, o Portal da Cidade convida a todos para conhecer o mundo do circo que existe por detrás das cortinas do picadeiro! Aproveitamos que Lucas do Rio Verde está recebendo a visita de um dos circos mais tradicionais do Brasil para descobrir como vivem os artistas que dão seqüência a uma arte milenar e que sobrevive a um mundo cheio de tecnologias e outras opções de lazer e entretenimento.

O circo na história
A arte circense aparece relatada em diversas culturas humanas e alguns relatos são tão antigos quanto a capacidade humana de registrar sua própria História. Do Egito à China, passando pela Babilônia e Índia, nos últimos 5 mil anos existem registros de malabaristas, mágicos, bailarinas, palhaços, pirotecnistas e companhia limitada encantam pessoas de todas as idades ao redor do mundo. No entanto, foi na Inglaterra vitoriana do século XVIII que o circo ganhou a configuração atual.

No Brasil o circo chegou no século XIX, trazido por famílias européias que já praticavam a arte circense em seus países de origem. Segundo os historiadores das artes cênicas, a política de tolerância aos imigrantes iniciada por Dom Pedro I logo após a independência do Brasil contribuiu para que famílias de ciganos e artistas de rua da Espanha, França e Portugal optassem por trocar a Europa pelo Brasil, fugindo da discriminação que sofriam no Velho Continente.


Apresentação - Circo Broadway (Foto: Assessoria)

160 anos sob a lona
Ronaldo Ramos de Abreu, o Ramito, é descendente de uma das primeiras famílias circenses que chegou no Brasil. Ele faz parte da quarta geração de uma família de artistas de circo que veio da Espanha e atravessou o Oceano Atlântico para atravessar o Brasil, cidade após cidade, levando o circo em lombo de mulas.

Hoje com 62 anos, Ramito conta que ainda se lembra das vezes que sua mãe o acomodava dentro de um balaio cheio de fantasias para cortar estradas e picadas e chegar aos mais longínquos rincões do Brasil.

“Naquela época caminhões e carretas eram artigo de luxo, minha família sequer sonhava com essa possibilidade. Nós levávamos o circo para o País inteiro usando o lombo de mulas e algumas poucas carroças [...] eu nasci e criei minha família debaixo da lona do circo e não trocaria essa vida por nada nesse mundo. Desde que minha família veio da Espanha há mais de 160 anos, temos percorrido o Brasil inteiro com uma só missão: levar alegria a este povo. Meus netos já fazem parte da sexta geração de artistas e espero muito que essa tradição tão bonita passe para além deles”.


Palhaços - Circo Broadway (Foto: Assessoria)

Dificuldades e falta de apoio
Porém, nem tudo são flores, conforme relata Ronaldo. Ele diz que, paulatinamente, o circo tem deixado de receber apoio por parte do Poder Público, que prefere investir milhões de Reais em um ou dois artistas famosos e não oferece sequer a mínima infra-estrutura ao circo.

“Até mesmo o espaço que ocupamos, a energia elétrica, a água, taxa do Corpo de Bombeiros, tudo é cobrado do circo hoje em dia [...] mesmo que sejamos reconhecidos por Lei Federal como um veículo de cultura, na prática somos deixados ao acaso pelas autoridades. A Lei Rouanet, por exemplo, só serve para beneficiar artistas que já ganham muito dinheiro sem nenhum tipo de incentivo ou para financiar espetáculos que vem do exterior [...] esquecendo-se de que o circo tradicional é um ramo que alimenta e emprega centenas de pessoas em cada cidade que para”, lamenta.


Trapezista - Circo Broadway (Foto: Assessoria)

Enquanto houver crianças
No entanto, Ramito enfatiza que o circo nunca morrerá. Segundo ele, “enquanto houver uma criança ou alguma pessoa que se encante com a magia do picadeiro, com o sorriso da bailarina, com as trapalhadas do palhaço, existirá um circo. Por cauda dessas pessoas é que a gente não pode deixar que o circo morra”.


Palhaço Xameguinho e crianças luverdenses (Foto: Portal da Cidade)

No picadeiro tudo se transforma
Talvez o nome de Marcos Antônio da Silva não chame a atenção de ninguém dentro do mundo do circo, mas é este artista que dá vida a um dos mais conhecidos e respeitados palhaços do Brasil: Xameguinho.

Há 34 anos Xameguinho faz do picadeiro sua razão de viver. Ele conta à nossa reportagem que tudo começou por acidente:

"Um dia um dos palhaços ficou doente e não pôde se apresentar e me fizeram um desafio [...] disseram que eu deveria substituí-lo, mas que duvidavam que eu fosse capaz de fazer o público rir... aceitei o desafio e cobri a aposta [...] disse que agradaria ao público mais do que eles todos, e foi o que aconteceu. Daí para diante deixei o trapézio e me tornei palhaço”.

O circo é minha vida
Marcos lembra que recebeu propostas tentadoras para deixar o picadeiro para trás, mas revela que “quem bebe da água que cai da lona do circo não consegue mais viver de outra maneira [...] já me ofereceram trabalhos que me renderiam dez vezes mais do que aquilo que recebo aqui, mas nada paga a satisfação de ouvir as gargalhadas do público [...] todos os problemas que tenho morrem depois que eu deixo para trás as cortinas e entro no picadeiro [...] lá em cima tudo se transforma e ganha um colorido diferente, a gente volta a ser criança, nosso coração fica leve e a alma fica livre [...] dinheiro nenhum do mundo paga isso. Eu não deixaria o circo por nada nesse mundo”.


Marcos Antônio da Silva, palhaço Xameguinho (Foto: Portal da Cidade)

Palhaço só nas horas vagas
O artista ainda revela que a contribuição de cada um dentro do circo vai além do palco. Ele conta que, durante o dia, enquanto o mundo lá fora vive sua rotina, cada integrante da família desempenha outros papéis para manter o circo funcionando.

“Tem gente que faz trabalho administrativo, outros cuidam da parte elétrica, há quem cuide das crianças, outros da limpeza [...] eu, por exemplo, quando não estou dando vida ao Xameguinho, trabalho na pintura dos equipamentos e veículos [...] agora há pouco eu saí do trabalho de funilaria de uma de nossas carretas. Isso é uma rotina... dormir tarde e acordar cedo no outro dia para deixar tudo pronto e receber bem o público que nos prestigia com a alegria que ele merece”, finalizou.

 

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